sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

MELHORES POEMAS DE AUGUSTO DOS ANJOS


Augusto dos Anjos nasceu no Engenho Pau d'Arco, atualmente no município de Sapé, Estado da Paraíba. Estudou no Liceu Paraibano, onde, posteriormente, foi professor. Compôs seus primeiros versos aos sete anos de idade. Foi identificado, muitas vezes, como simbolista ou parnasiano.
Em 1903, ingressou no curso de Direito na Faculdade de Direito do Recife, bacharelando-se em 1907. Seu contato com a leitura, influenciaria muito na construção de sua dialética poética e visão de mundo.
Absolveu, com a obra de Herbert Spencero conceito da monera como princípio da vida, e de que a morte e a vida são um puro fato químico. Com Arthur Schopenhauer assimilou que o aniquilamento da vontade própria seria a única saída para o ser humano.
Augusto dos Anjos faleceu, em decorrência de uma pneumonia, em 12 de novembro de 1914, aos 30 anos, em LeopoldinaMinas Gerais.  Na casa em que residiu, durante seus últimos meses de vida, funciona, hoje, o Museu Espaço dos Anjos.
Publicou vários poemas em periódicos. O primeiro, Saudade, em 1900. Em 1912, publicou seu livro único de poemas, Eu

POEMAS

MÁGOAS
Quando nasci, num mês de tantas flores,
Todas murcharam, triste, langorosas,
Tristes fanaram redolentes rosas,
Morreram todas, todas sem olores.

Mais tarde da existência nos verdores
Da infância nunca tive as venturosas
Alegrias que passam bonançosas,
Oh! Minha infância nunca teve flores!
Volvendo a quadra azul da mocidade,
Minh’alma levo aflita à Eternidade,
Quando a morte matar meus dissabores.
Cansado de choras pelas estradas,
Exausto de pisar mágoas pisadas,
Hoje eu carrego a cruz das minhas dores!

MARTÍRIO DO ARTISTA
Arte ingrata! E conquanto, em desalento,
A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda,
Busca exteriorizar o pensamento
Que em suas fronetais células guarda!


Tarda-lhe a Idéia! A inspiração lhe tarda!
E ei-lo a tremer, rasga o papel, violento,
Como o soldado que rasgou a farda
No desespero do último momento!
Tenta chorar e os olhos sentem enxutos!…
É como paralítico que, à míngua
Da própria voz e na que ardente o lavra
Febre de em vão falar, como os dedos brutos
Para falar, puxa e repuxa a língua
E não lhe vem à boca uma palavra!

O MORCEGO
Meia-noite, ao meu quarto me recolho.
Meu Deus ! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho
” Vou mandar levantar outra parede …”
– Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre minha rede
Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh’alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!
A consciência humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto.



VERSOS ÍNTIMOS

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera -
Foi tua companheira inseparável!



Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.


Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.


Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!


SONETO DO NASCIMENTO

Agregado infeliz de sangue e cal
Fruto rubro de carne agonizante
Filho da grande força fecundante 
De minha brônzea trama neuronial 

Que poder embriológico fatal 
Destruiu, com a sinergia de um gigante, 
A tua morfogênese de infante, 
A minha morfogênese ancestral?! 

Porção de minha plásmica substância, 
Em que lugar irás passar a infância, 
Tragicamente anônimo, a feder?!... 

Ah! Possas tu dormir feto esquecido, 
Panteisticamente dissolvido 
Na noumenalidade do NÃO SER!

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