domingo, 31 de julho de 2011

VENTRE AO VENTO

Teu corpo desenha
linhas, contornos
relevos
no temo
sedução, movimento
efêmero açoite
rito-fêmea
fome, cio
prenhes de noite...


Convite ao pecado
vontades da carne
da língua
da derme
vielas da tara
desejos calados
dos poros abertos
dos lábios molhados...


Desse ventre suado
de perfume sagrado
do fruto molhado
sai mistura de som
de suor, sol e sal
um gesto traiçoeiro
um suspiro, um olhar
nessa boca enorme
a engolir-me inteiro...


Deslumbrado, espero
a mordida canina
o beber da luz-alma
o chupar nessa vara
com esse toque que cala
viro bicho vermelho
roliço e erecto
um pulsante objeto...


Teu alimento
esse olhar
insuportável atração
que me sorve,  me come
teu escravo completo
que me bebe, me morde
dilacera o pescoço
e me lambe o osso...


Na saliva, deserto
abjeto, brinquedo
de todo desejo
de todo tesão
a libido
água doce
que embriaga e cega
que sacia e mata
sede do coração...




Por fim:


Roubar-lhe um riso
um somente, semente
filho dessa paixão
desse fogo de mim
voo preso ao colchão
e tua alma ao vento
e essa ira animal
a fazer-me rebento...


... a tornar-me detento.


C.H.Gonçalves 

sexta-feira, 29 de julho de 2011

IN VAUM

[por vocação]
... no vão de um muro vil
escrevo um poema vão...


[Provocação]
... no chão eu urino um rio
a saliva de um mundo cão.


C.H.Gonçalves

quinta-feira, 28 de julho de 2011

O QUE ESPERAS?

O QUE ESPERAS?

Grita,
agora...

- Que tal...

Jogou fora?

Jogou teu rancor
amor?

- Não és capaz? Tenta...

Há tempo...

ainda podes
me fazer
olhar para trás...

e nada mais.

C.H.Gonçalves

terça-feira, 26 de julho de 2011

ÚLTIMO PARTO

Então,
o mundo abriu as pernas
deixou entranhas expostas
a vida virou-lhe as costas
viu-se o céu
calado
úmido
nublado
véu de azul pastel


...


Então,
restou matéria
ferida seca
coágulos na artéria
cama de pedra fria
corpo seco
sem perfume
nem alma
frio a luz do dia


...


Então,
ele saiu
fitando lua, gelada, nua
nu
breve sorriso,  subiu
livrou-se da dor
da carne crua


...


Então,
as nuvens sangraram
líquido cristal
retina deserta
e os olhos vazaram


...


Então,
chuva, mares
choro, rios
perdas, tantos amores


...


Então,
a terra se alimentou


...


Então,
o coração aquietou...

Então,
a mão o verbo criou

... assim é a vida:
parto, partida...

... então, compreendi:

- Agora, te levo por dentro... Por fora, sigo sem ti.

C.H.Gonçalves

segunda-feira, 25 de julho de 2011

SERPENTE

Há um silêncio
em mim
que teima em gritar...

Feito serpente
minha língua
imersa em saliva
o sufoca
mata
devora...

O gosto do sangue me alimenta e cala.

C.H.Gonçalves

quinta-feira, 21 de julho de 2011

EM PEDAÇOS

Destroçado
ando catando os cacos
da última queda


nada que me prive de pular
nada que me impeça de sonhar


se viveres até lá...


verás 
a linda colcha de retalhos


que, pelas mãos da dor
que, pelos seios do amor


... me transformei.


- cuidado, não pise em meus cacos!


C.H.Gonçalves 

quarta-feira, 20 de julho de 2011

INverso|osrevNI

... meu inverso? - convexo.
Luas
Chuvas
Sóis
descaminhos,
universos...


[nos, presos em cegos nós, tecidos à língua, entre lençóis – a sós]


... teu reverso? – côncavo.
Carnes
Sangue
Peles
desalinhos
perversos...


[Nos: Duas almas; um corpo...   Eu reato nós; ela une versos]


C.H.Gonçalves 

terça-feira, 19 de julho de 2011

domingo, 17 de julho de 2011

À BALA

Uma
bala 
perdida
sempre
encontra
uma
vida.


.......................​..... Uma bala
encontrada. 
Uma vida
perdida ..............................​.


C.H.Gonçalves 

sexta-feira, 15 de julho de 2011

PERDAS E ENCONTROS


Quando passei, de mãos dadas com meu Dos Anjos, entre si, comentaram as duas senhoras.

- Esse menino é tão inteligente. - disse a de cabelos vermelhos referindo-se a mim.
- Pena que não quer nada com nada. - reforçou a de anéis de ouro.
- Poderia estar rico, mas só quer saber de arte. Como se arte enchesse barriga. - completou a primeira.

Ironicamente, pensei: arte, tão somente, enche a mente.

- Coitado... Se perdendo. - finalizou a segunda senhora.

Não adiantaria dizer a elas que estou me encontrando.

C.H.Gonçalves

NO INÍCIO ERAM LÁGRIMAS

(dedicado a Soninha Porto)

- Quê poema lindo... Onde você esteve, poeta? - Ela perguntou.

- Dentro de mim. Durante quarenta anos, estive preso em mim... Quando meu pai abriu a porta para subir aos céus, aproveitei e fugi para pedir que ficasse... Não consegui... Então retornei a porta. Ela estava fechada (foram as asas de meu pai que, sem querer, as fecharam)... Minha porta estava trancada... Feito criança, chorei. As lágrimas viraram palavras; e palavras poemas... Estou preso para fora... Agora, grito o que sentia por dentro... Solto o verbo para ver se minh’alma - o que restou dela - vem abrir a porta do meu corpo para eu entrar e descansar. Eternamente. - respondi.

E foi assim... Simples assim.

C.H.Gonçalves

quarta-feira, 13 de julho de 2011

MORENINHO

Todos contavam bafos. Uns diziam que seus avós eram italianos; outros que os país eram descendentes de americanos; uma se orgulhava de ter origem holandesa; outra que a família veio da França... Antônio, no círculo de jovens, permanecia quieto em meio a confusão e desfile de vaidades...

- Meus avós eram africanos. Sou negro. - falou, convicto, Antônio.

Como por magia, um silêncio tomou conta do ambiente... Em seguida, alguns começaram a rir e logo foram reprendidos pelos olhares de alguns. Olhares de surpresa. Alguns beirando a comoção.

- Não fique assim. Você não é preto não. És moreninho. - disse Paula para "consolar" o amigo.
- Mesmo que fosse não precisaria ficar assim. No Brasil, não existe racismo. Concluiu, um dos meninos que antes rira.

Será?

C.H.Gonçalves

quinta-feira, 7 de julho de 2011

terça-feira, 5 de julho de 2011

IPOD SORRIR

Não tenho vocação para ganhar dinheiro. Sequer sei se isso é bom ou mal... Pouco importa. Tenho o suficiente para viver e sorrir... Mas, pensando bem, eu bem que queria um IPAD, um IPOD, um Kia Soul e um Sítio em Benevides com igarapé de águas claras e geladas... Pensando melhor, vivo bem sem esses itens... Se eu trabalhasse mais algumas horas, sábados e domingos teria um Kia Soul. Trabalharia 18 horas. Seis horas são suficientes para descansar... Espera ai... Quem iria brincar com meus filhos? Quem assistiria filmes com minha esposa? Quem visitaria minha mãe? Quem jogaria futebol com meus amigos? E meus livros, quando os leria? Não, não quero gastar meu tempo para ter um IPOD. Quer saber, sou feliz com o que tenho... Por falar nisso, hoje pela manhã, brinquei de jogo da memória com meus filhos. Foi maravilhoso, percebi que são inteligentes e estão crescendo. A pouco, eu me diverti com minha amada companheira relembrando o dia que nos conhecemos. Depois, nos amamos... Por que estou dizendo essas bobagens? Estou bobo? Sim, estou! Ser feliz é ficar meio abestalhado... Mudando de assunto. Tenho uma boa notícia para dar: a cirurgia do meu filho Gabriel está cicatrizando. Isso me emociona. Deixa os olhos molhados. Desculpe-me, sou emotivo. A racionalidade me cansa e enrijece. Sou morada da paz... Por que estou dizendo isso tudo? Felicidade. Consigo com tão pouco rir e fazer rir. Sou bobo e os bobos provocam risos... Orgulho-me em ser feliz com pouca grana no bolso. Pior são os que, abarrotados de dinheiro, jamais conseguirão comprar suas felicidades. Sou feliz, por muitas vezes, sem gastar um centavo... Por falar nisso, acabou de chegar meu IPAD, comprado em parcelas a perder de vista.
C.H.Gonçalves

segunda-feira, 4 de julho de 2011

PARTILHA

Após meu parto,
uma única certeza:
um dia incerto,
para sempre,
parto...


... Antes disso,
(re)parto-me.


C.H.Gonçalves

- SUGA-ME!

Une-te:
corpo ao crânio
ombro ao queixo
ser à alma
vida ao sonho...
- PERCO A CABEÇA!
D’onde, água, derramas
D’onde vazas lágrimas
D’onde cios são chamas...

Curva-te:
linhas suaves, alegres, saudáveis
contemplativo
caminho...
- PERCO A CABEÇA!
no trajeto ao ofertório
na via jugular
na lápide-pergaminho
no teu precioso ninho...


Sigo-te:
por entre meios
por lábios
que levam
aos seios,
à luxúria e anseios...
- PERCO A CABEÇA!
nesses mistérios
perfume de fêmeas
essências, sabores
licores etéreos...


Deixo-te:
pêlos eriçados
arrepio, suspiros...
- PERCO A CABEÇA!
ao despir-te, ao despir-me
tua forma perfeita
em refeita textura
a passagem estreita
fio, tessitura
calor da minha língua
espera, espreita...


Sufoca-me:
a parte delgada
do tronco; no pólo
na lágrima salgada
da carne sangrada
fecundo solo
pele embriagada
- PERCO A CABEÇA!
se me faço colo...

Acalma-me:
teu templo alado
profano, calado
vestido de pêlos
despido o sagrado
entre cabelos
longos, curtos, inteiros...
- PERCO A CABEÇA!
em sussurros e apelos...


Louvo-te:
ser vertebrado
pois vivo por ti
ser maldito, acuado
rei do calor
senhor do pecado
- PERCO A CABEÇA!
com o dente encravado...

Fim
Se te quebro o osso...

Fim
se te lambo o caroço...

Perco a cabeça
Se te sugo, PESCOÇO.

C.H.Gonçalves

sábado, 2 de julho de 2011